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Como alossexuais descobriram tudo o que você deve esperar na primeira vez

O MANUAL DO ENCONTRO ASSEXUAL

Encontros organizados pela comunidade assexual promovem interação e compartilhamento de conhecimento sobre essa orientação

Não estamos falando de um encontro romântico, muito pelo contrário. Os encontros organizados pelos diversos grupos sobre assexualidade no Facebook têm como premissa reunir membros da orientação sexual em busca de um objetivo comum, seja ele qual for. E pelo que pudemos observar, eles variam em número, gênero e grau, assim como os assexuais.

Mas antes que possamos desvendar os detalhes desse fenômeno, você deve estar se perguntando, o que é assexualidade? Na verdade, a assexualidade é uma orientação caracterizada pela ausência de atração sexual e que, ao contrário do celibato, não é uma escolha, mas sim uma característica intrínseca do ser humano, como define a AVEN (Asexual Visibility and Education Network), maior comunidade assexual e referência no assunto.

De acordo com os resultados do Programa de Estudos em Sexualidade ou ProSex, conduzido pelo Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo desde 1993, a assexualidade pode ser representada por pelo menos 1% da população brasileira. São os chamados assexuais, aqueles que se identificam com a orientação.

Antes que você pense que a definição é simples, ser assexual não necessariamente significa que não há interesse em manter relacionamentos afetivos. A verdade é que dentro dessa orientação existem diferentes classificações de assexualidade cujas características variam e esse é um dos motivos que leva essa galera a se unirem e promover os encontros.

Encontros Assexuais

Em uma breve consulta ao Dicionário Aurélio é possível achar a definição da palavra "encontro": ato de chegar até à pessoa ou coisa que se encontra. Analisando esse significado pela ótica da assexualidade é impossível ignorar a necessidade de determinar o que leva o assexual à necessidade de se encontrar, e em pelas nossas pesquisa sobre o tema, pudemos logo perceber que a grande maioria, senão todos, são instigados pela necessidade de identificação e construção de laços com pessoas semelhantes.

Embora a motivação seja constituir uma comunidade, existem basicamente dois tipos de encontros: àqueles voltados apenas para a socialização, comumente chamados de piqueniques, e àqueles que além da socialização, buscam debater e esclarecer questões sobre a assexualidade, chamados debates.

Fica, vai ter bolo

Utilizando o formato piquenique, um grupo de pessoas interessadas em dividir uma refeição, se conhecer, conversar, rir e fazer amizades, se reúne em busca do objetivo único de socializar, criar uma teia de relacionamentos conectada por fios que vão além da assexualidade, tema que na maioria das vezes nem sequer é abordado.

A assistente social Lígia Alves, que aos 36 anos se identifica como heterorromântica, aqueles que têm interesse em um relacionamento romântico de natureza heterossexual, é uma das organizadoras desses eventos.

Ela faz parte de algumas comunidades assexuais no Facebook e há dois anos, após observar uma organização dos assexuais de Minas Gerais, decidiu promover encontros em São Paulo com a ajuda de alguns colegas. “O intuito é aproximar as pessoas. A gente conversa pelo Facebook e percebe que elas se sentem muito sozinhas, incompreendidas, alguns gostariam de ter um relacionamento, os próprios amigos acabam excluindo essas pessoas por conta da assexualidade”, reforça.

Os piqueniques são realizados todo último domingo do mês, mas há uma restrição: apenas assexuais podem frequentá-los. Lígia explica que o grupo já enfrentou problemas sérios com a presença de alossexuais, aqueles que têm atração sexual. “Há relatos de que pessoas foram ao encontro, se identificaram como assexuais, marcaram encontros (com outros assexuais) fora do nosso grupo, mas a intenção dessa pessoa era curar a assexualidade da outra, no caso, um estupro”, revela.

Apesar da experiência negativa ter servido como um alerta para a comunidade, a organizadora destaca que os encontros cumprem com seu papel e acolhem àqueles que muitas vezes passam por inúmeras dificuldades causadas pela falta de reconhecimento sobre a assexualidade.

Eu só acho engraçado que...

Menos frequentes que os piqueniques, os debates ou discussões organizados com o objetivo principal de promover a troca de conhecimento, experiências e esclarecer dúvidas sobre a assexualidade têm ganhado força. Um exemplo bem sucedido desse crescimento é a série de debates que vem sendo desenvolvida pela artista visual Cristina Varkulja, que aos 46 anos se identificou como assexual fluída, aquele que varia entre sentir atração sexual e ter total repulsa.

Em uma conversa, Cristina explicou que os encontros têm como principal objetivo contribuir para o esclarecimento de questões importantes sobre a assexualidade e ajudar aqueles que estão em fase de identificação. “Eu me descobri recentemente justamente por falta de informação, de divulgação sobre a assexualidade. Por eu trabalhar num centro cultural que é aberto às minorias, foi só um link. Eu acho que (o encontro) é primordial para a gente ter uma visibilidade, ser aceito, se conhecer e tudo mais”, reforçou.

Com a ajuda de alguns amigos, Cristina organizou o primeiro Debate sobre Assexualidade realizado na Casa da Luz, no dia 20 de Julho de 2017. O encontro reuniu aproximadamente 20 jovens, entre os quais, além de assexuais, estavam interessados, pesquisadores e jornalistas. “A princípio achei que iriam cinco pessoas, mas foram bastante. Eu esperava que fossem mais assexuais, na verdade. Fiquei mais decepcionada por isso. Mas eu acho que é um começo, tudo tem seu tempo”, reflete.

A discussão entre o grupo presente evoluiu do compartilhamento de relatos, para o esclarecimento de dúvidas e chegou até a construção de conceitos sobre como a assexualidade é vista pela sociedade. É possível notar a diversidade de ideias e propostas a respeito de tema como a necessidade de nomear as subdivisões da assexualidade, por exemplo, tema abordado e amplamente discutido nesse dia.

Ao contrário do que acontece com os piqueniques (pelo menos os organizados pela Lígia e seus colegas), os Debates sobre Assexualidade, previstos para acontecer pelo menos uma vez ao mês, não restringem a presença de alossexuais, muito pelo contrário. A disseminação de conhecimento para a sociedade é amplamente difundida, como reforça Cristina Varkulja, “eu acho muito interessante eles terem essa curiosidade e como em qualquer movimento, a vinda de pessoas que não fazem parte desse grupo é muito bem-vinda, fortalece. São pessoas que têm interesse em conhecer, é uma força a mais que você está somando”.

Não é bem assim

Independentemente do formato, os encontros organizados pelos assexuais não são novidade, como nos contou Elisabete Oliveira, principal pesquisadora sobre assexualidade no país. Em outubro de 2015, aconteceu a Primeira Parada Assexual de São Paulo.

A pedagoga, mestre e doutoranda em Sociologia da Educação esteve presente nesse marco e nos revelou uma característica importante desse e de todos os encontros: embora haja uma grande adesão no ambiente online, onde costumam ser organizados, os eventos contam com pouca presença, e naquela Parada não foi diferente. “A parada foi no MASP, foram quinze pessoas, foi a primeira e única, não houve uma segunda. Eu estava achando inclusive que aquilo ia ser o começo de alguma coisa.”

E parando para analisar, isso de fato ocorre com a maioria dos encontros. Independente de ser piquenique ou debate, é fácil perceber que algo intimida os assexuais e os reprime de interagir socialmente. “Eu percebo que eles são muito inseguros em se mostrar, apesar de eu ter falado sempre que a gente ia ser acolhido, que era um lugar seguro e não teria nenhuma opressão, preconceito, muitos não foram”, reflete Cristina Varkulja, sobre o Debate realizado na Casa da Luz. O evento, que contou com a presença de aproximadamente 20 pessoas, teve 57 confirmações de presença e 299 demonstrações de interesse no Facebook.

Embora hoje ajude a promover os encontros piquenique, antigamente a Lígia Alves caracterizava bem esse fenômeno. Ela conta que logo ao se identificar como assexual, ainda na época do Orkut, viu em uma comunidade online um convite para participar de um piquenique e decidiu ir, mas sua experiência não foi completa. “Eu cheguei a ir, mas não tive coragem, na época, de me juntar ao grupo. Eu fui até o local, vi as pessoas, mas eu era muito introvertida”, explica.

Além de citar a introversão, Lígia concorda com a Cristina em relação a insegurança e o medo do preconceito que essas pessoas têm, e explica “quando a gente fala que vai alguém de fora, um desconhecido, cai o número de participantes do encontro. Embora para algumas pessoas não haja problemas, algumas se sentem intimidadas, muitas vezes porque a família não sabe e a pessoa não quer falar. Elas preferem se manter preservadas".

Para Elisabete trata-se de uma característica causada pela formação social do brasileiro. “O brasileiro não é muito de comunidade. Essa ideia de comunidade virtual, pelo menos entre os brasileiros, não funcionou. Apesar de haver muitas discussões, nunca conseguiu decolar.” A docente afirma ainda que é necessário buscar compreender porque isso ocorre, mas que uma hipótese é que talvez “não haja, por exemplo, a luta por uma pauta única. As pautas assexuais aqui no Brasil são relacionadas à visibilidade, à questão da aceitação, fazer parte ou não da comunidade LGBT”, e que possuem pouca força para formar uma unidade.

Levando isso em consideração, a pesquisadora se mostrou surpresa com o fenômeno de crescimento e organização dos encontros do tipo debate. “Aquele evento que nós tivemos lá (na Casa da Luz) mesmo, foi raríssimo, eu nunca tinha estado nem mesmo nunca soube que tivesse acontecido antes. Todos os anos em que eu estou estudando a assexualidade, foi a primeira vez, nunca rolou um encontro daquele. Aquilo foi um evento único”, reforça.

Em sua maioria, os convites são disseminados em grupos de Facebook e Whatsapp, uma vez que a internet é um local comum à essa comunidade

Debate sobre Assexualidade realizado na Casa da Luz foi o primeiro de muitos que a Cris e seus colegas pretendem organizar

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Tudo o que você precisa saber sobre essa orientação sexual 

O QUE É ASSEXUALIDADE?

Viver sem sexo, você consegue imaginar? Pois é, para os assexuais isso é mais do que normal. Mas assexuais? Como assim?

 

Segundo a AVEN, Rede de Educação e Visibilidade Assexual, maior portal online sobre o tema no mundo, "assexual é a pessoa que não tem atração sexual". O fato de não manterem vida sexual ativa não quer dizer que não se relacionem com outras pessoas.


Assexualidade não é uma patologia e pode ser considerada uma orientação sexual. É uma das formas de demonstração da sexualidade humana e pode ser manifestada de diferentes formas. Há pessoas que se apaixonam e desenvolvem relacionamentos afetivos e há pessoas que não têm interesse em atrações românticas. Não gostar de praticar sexo não significa que eles não sentem amor ou que são avessos aos sentimentos.

 

Mas não os confunda com os celibatários, que são pessoas que optam por não praticar o sexo. Outra questão é o transtorno do desejo sexual hipoativo (TDSH), que é uma disfunção que causa sofrimento e dificuldades interpessoais.

                  

Diferentemente de pessoas que têm o TDSH e procuram especialistas para tratamento e estabilidade da libido, as pessoas que se reconhecem como assexuais não sofrem por não manterem relações sexuais ou por não sentirem a atração.

 

O assunto, por ser pouco discutido, é desconhecido pela maioria das pessoas. Esta escassez de informação também traz problemas à própria comunidade assexual, que, além da falta de reconhecimento de sua orientação, os próprios indivíduos que ainda não se identificaram como tal, tem muitas dificuldades, confundindo até a própria sexualidade.

A AVEN é a principal fonte de informações para quem se interessa pelo tema. No Brasil, o primeiro site voltado para a orientação é o www.assexualidade.com.br, que está no ar há oito anos e possui espaço para fóruns de discussão, redes sociais e contato via e-mail.

 

De acordo com os administradores da página, que preferem utilizar os pseudônimos Sha e Romântico, a falta de conhecimento causa preconceitos. “Ouvir de pessoas que nunca conversaram com um assexual, que nunca estudaram sobre o assunto, que isso é doença, que não existe ou que é só uma fase, é péssimo”, dizem.

 

Apesar do preconceito, “Sha” e “Romântico" falam da importância da página para os assexuais, “muitos nos agradecem principalmente pelo espaço e por encontrar pessoas como eles. Com isso, percebem que não estão sozinhos e adquirem mais conhecimento sobre o assunto.”

 

Visibilidade e reconhecimento são alguns dos objetivos da comunidade, “é importante para que as pessoas saibam da existência da assexualidade e passem a encará-la como algo normal, apenas mais uma orientação entre tantas”, completam Sha e Romântico.

 

Para a militante Cláudia Costa “acabar com a ideia de que sexo é uma necessidade é um passo importante para o reconhecimento como orientação sexual”. Cláudia questiona que o papel dos membros da comunidade é fundamental para tornar o assunto conhecido, e reclama da dificuldade “de encontrar pessoas que estejam dispostas a falar que são assexuais dando o próprio nome”. Para ela, isso dificulta que o grupo faça reivindicações por direitos.


Guilherme Azeredo é assexual e acredita que a orientação não é percebida devido à falta de interesse da sociedade, e também “pelo medo de exposição dos assexuais em relação aos sexuais”. De acordo com Tatiana Leite, psicóloga e terapeuta sexual, “não existem estudos que comprovem tais questionamentos sobre a assexualidade relacionados à traumas ou depressão”.

 

Algumas pessoas quando estão no momento de descoberta procuram ajuda pensando ter algum problema. Segundo Tatiana, “é importante ao procurar um profissional da área da saúde, identificar-se como assexual e confirmar que o não interesse pela prática é algo que não traz nenhum incômodo ou prejuízo para sua vida afetiva sexual. Se esta pessoa estiver ajustada com a sua parceria não estamos tratando de uma patologia médica”.

 

Por outro lado, o psiquiatra Mário Louzã, não acredita na assexualidade como orientação sexual, para ele, a assexualidade é uma disfunção psicológica. “Na maioria das vezes, essas pessoas têm algum tipo de problema de ordem psicológica, uma inibição em relação a como lidar com a própria sexualidade”, diz. Louzã afirma que a assexualidade não é uma patologia física, e por isso o tratamento “é de ordem psicoterápica”.

 

De acordo com o psiquiatra Mário Louzã, as redes sociais possuem uma força muito grande, pois ajudam a disseminar as ideias muito rápido. Para ele, "os grupos se formam e tomam volume". Ainda segundo Louzã, a sociedade atual possui característica muito narcisista. “Me parece que a assexualidade é uma forma de você não ter que sair da sua própria concha, é uma pessoa que está voltada pra si própria”, falou.

 

A assexualidade é um tema que ainda não é muito abordado e não possui muitos estudos, tanto de ordem médica quanto de ordem acadêmica. Há quem acredita que é orientação sexual, e também os que pensam ser algum tipo de inibição. 

 

Para alguns, a sexualidade faz parte do instinto humano e o sexo é mais do que método para procriação, é objeto de prazer. Mas, na contramão da sociedade hipersexualizada que estamos inseridos, cerca de 1% da população mundial não sente prazer com o sexo. Eles até preferem o bolo. Eles são os assexuais.

Confira na galeria abaixo alguns dos símbolos da assexualidade, segundo a AVEN, Rede de Educação e Visibilidade Assexual.

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10 SUBDIVISÕES DA ASSEXUALIDADE QUE VOCÊ NÃO CONHECIA 

Em geral, os assexuais são pessoas que não curtem sexo, mas não é tão simples assim. Clique na imagem abaixo e veja as mais diversas subdivisões da assexualidade

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Falar que não curte sexo em um mundo hipersexualizado como o nosso já é difícil, agora imagina ter que ficar aguentando sempre as mesmas perguntas da galera desinformada. Clique na imagem abaixo e veja as coisas mais chatas de se ouvir para um assexual
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